As origens dos direitos fundamentais

De Baripedia

Baseado num curso de Victor Monnier[1][2][3]

Os direitos fundamentais, frequentemente designados por direitos humanos, são princípios jurídicos essenciais destinados a proteger a dignidade e a liberdade individuais. Com raízes em diversas tradições históricas e filosóficas, estes direitos são atualmente reconhecidos e respeitados universalmente em todo o mundo.

Os primeiros vestígios de direitos fundamentais remontam a civilizações antigas e a textos religiosos, onde os conceitos de justiça e equidade já estavam presentes. Por exemplo, as leis do Antigo Testamento, o direito romano e os ensinamentos filosóficos da Grécia antiga ofereciam reflexões primitivas sobre os direitos e os deveres dos indivíduos. Na Idade Média, estes conceitos continuaram a desenvolver-se, nomeadamente na Europa. A Carta Magna, assinada em 1215 em Inglaterra, é um exemplo precoce de um documento jurídico que concede certos direitos, como o direito a um julgamento justo e a proteção contra a arbitrariedade real, embora esses direitos estivessem limitados a uma parte da sociedade. O Iluminismo foi um período crucial para o desenvolvimento dos direitos fundamentais. Filósofos como John Locke, que defendeu a noção de direitos naturais e inalienáveis na sua obra "Dois Tratados sobre o Governo", de 1689, e Jean-Jacques Rousseau, com a sua ideia de contrato social, lançaram as bases teóricas dos direitos humanos. As suas ideias inspiraram várias declarações históricas, incluindo a Declaração de Independência dos Estados Unidos em 1776 e a Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1789. Estes documentos foram revolucionários, reconhecendo formalmente direitos como a liberdade e a igualdade. O século XX assistiu a um grande avanço no reconhecimento internacional dos direitos fundamentais. Os horrores da Segunda Guerra Mundial levaram a uma consciencialização global da necessidade de proteger estes direitos. As Nações Unidas, fundadas em 1945, desempenharam um papel fundamental nesta evolução. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, adoptada em 1948, foi um marco importante, estabelecendo um conjunto de direitos fundamentais reconhecidos em todo o mundo.

Ao longo dos anos, muitos países incorporaram estes princípios nas suas constituições e leis nacionais. Tratados internacionais, como a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, adoptada em 1950, reforçaram a proteção e a promoção destes direitos.

Origens religiosas[modifier | modifier le wikicode]

Na Antiguidade, a noção de direitos individuais, tal como a entendemos atualmente, não existia realmente e o indivíduo estava frequentemente sujeito a regras e normas rigorosas impostas pelo Estado ou pela sociedade.

Em Esparta, por exemplo, a vida era estritamente controlada pelo Estado. O celibato era proibido porque a sociedade espartana dava ênfase à força militar e à reprodução para manter um exército poderoso. Esperava-se que os cidadãos espartanos contribuíssem para a sociedade principalmente através da procriação e do serviço militar, limitando assim a sua autonomia pessoal. Na Roma antiga, as leis regulavam aspectos da vida quotidiana que hoje seriam considerados privados. Por exemplo, o consumo de vinho puro era limitado. Estas regras reflectiam as preocupações morais e sociais da época, em que a moderação e o autocontrolo eram valorizados. Em Atenas, as restrições impostas às mulheres também ilustravam a ausência de direitos individuais tal como os conhecemos. As mulheres atenienses estavam em grande parte confinadas à esfera doméstica e tinham poucos direitos políticos ou legais. A limitação do número de vestidos que uma mulher podia levar para fora da cidade é um exemplo das muitas restrições à autonomia e à liberdade das mulheres nessa sociedade.

Estes exemplos mostram que, na Antiguidade, a autonomia individual estava frequentemente subordinada às necessidades da sociedade ou do Estado. Os direitos à integridade física e mental, tal como os entendemos no contexto moderno dos direitos humanos, não eram reconhecidos. Os indivíduos eram vistos, em grande medida, como membros de uma coletividade, com obrigações e deveres para com ela, e não como entidades com direitos inalienáveis. Esta perspetiva do indivíduo e do poder evoluiu consideravelmente ao longo dos séculos, acabando por conduzir ao reconhecimento dos direitos fundamentais tal como os conhecemos atualmente.

Nas sociedades antigas, em particular em Atenas, a liberdade era frequentemente conceptualizada como a capacidade de participar na vida pública e na gestão do Estado. Esta participação era vista como um privilégio e uma responsabilidade dos cidadãos, mas estava limitada a uma fração da população - geralmente homens livres que possuíam terras. As mulheres, os escravos e os estrangeiros estavam excluídos desta esfera de participação política. Neste contexto, não existia uma esfera reconhecida de liberdade individual no sentido moderno. Os direitos e as liberdades eram definidos e limitados pelo estatuto na sociedade e pela pertença à comunidade política. A privacidade e os direitos individuais não eram conceitos amplamente reconhecidos ou valorizados.

O surgimento do cristianismo, por outro lado, trouxe uma nova dimensão ao conceito de indivíduo e de liberdade. O cristianismo introduziu a ideia da igualdade fundamental de todos os seres humanos perante Deus, uma ideia revolucionária para a época. Esta perspetiva lançou as bases para um maior reconhecimento da dignidade e do valor intrínseco de cada indivíduo, independentemente do seu estatuto social ou do seu papel na comunidade política. Com o tempo, os ensinamentos cristãos sobre o amor ao próximo, a compaixão e a igualdade de todos perante Deus ajudaram a corroer as rígidas estruturas sociais e jurídicas da Antiguidade. Estas ideias lançaram as bases para uma compreensão mais moderna da liberdade, em que o valor do indivíduo não depende apenas da sua capacidade de participar na vida pública, mas radica também na sua própria dignidade e nos seus direitos enquanto ser humano. No entanto, é importante notar que a transformação das noções de liberdade e de direitos individuais não aconteceu de um dia para o outro com o advento do cristianismo. Foi um processo gradual, influenciado por muitos outros factores históricos, filosóficos e culturais ao longo dos séculos.

O ensino cristão, com as suas raízes profundas nos textos e tradições bíblicas, introduziu ideias revolucionárias sobre a natureza e a dignidade humanas que influenciaram profundamente o pensamento ocidental. No centro desta visão está a crença de que cada ser humano é criado à imagem de Deus, uma ideia que teve origem nas escrituras hebraicas e que foi adoptada e desenvolvida pelos primeiros pensadores cristãos. Esta noção, ao afirmar que todos os homens são criados à imagem de Deus, introduziu um conceito de igualdade fundamental e a dignidade inerente a cada pessoa. Esta ideia era radicalmente diferente das hierarquias sociais e das estruturas de poder que prevaleciam nas sociedades antigas. Por exemplo, na sociedade romana, dominada por distinções rígidas entre cidadãos, não-cidadãos, escravos e libertos, a doutrina cristã oferecia uma perspetiva diferente, afirmando o valor igual de todos os indivíduos, independentemente do seu estatuto social. Além disso, a crença na imortalidade da alma, um conceito central no cristianismo, reforçava esta ideia da dignidade intrínseca e eterna do ser humano. Esta perspetiva encorajava uma visão da vida humana como tendo um significado para além do material e temporal. Pensadores cristãos como Agostinho de Hipona (354-430 d.C.) e Tomás de Aquino (1225-1274 d.C.) exploraram estas ideias, salientando a importância da vida espiritual e o valor eterno da alma humana.

O impacto destes ensinamentos na conceção ocidental da liberdade e dos direitos humanos foi profundo e duradouro. Enquanto as sociedades antigas se centravam sobretudo no coletivo e no lugar do indivíduo no Estado, o cristianismo introduziu uma nova dimensão, a do valor individual. Esta mudança foi essencial para o desenvolvimento subsequente das ideias de direitos humanos e de respeito pelo indivíduo. Estes conceitos desempenharam um papel crucial na formação do pensamento político e social no Ocidente, influenciando movimentos como a Reforma Protestante no século XVI, que sublinhou a importância da consciência individual, e o período do Iluminismo, quando filósofos como John Locke desenvolveram teorias sobre os direitos naturais e o governo. Deste modo, os fundamentos lançados pelo cristianismo abriram caminho para uma compreensão mais rica e matizada da liberdade individual e dos direitos humanos.

A mensagem central do cristianismo, tal como ensinada por Jesus Cristo, assenta na ideia de que a vida terrena é apenas uma fase transitória da existência do homem, destinada à vida eterna. Esta visão influenciou profundamente a forma como a dignidade humana tem sido percepcionada e valorizada na cultura e no pensamento ocidentais. De acordo com esta perspetiva, a vida terrena é vista como uma preparação, um caminho para um destino final que é a vida eterna. Este conceito transcende a ideia de uma existência centrada apenas em preocupações materiais ou temporais. Coloca a tónica nos aspectos espirituais e morais da existência, sublinhando valores como a compaixão, o amor ao próximo e a busca de uma vida virtuosa. Esta compreensão da vocação humana para a vida eterna conduziu a uma maior valorização da dignidade de cada pessoa. Nesta visão do mundo, o valor do indivíduo não reside nas suas realizações terrenas, no seu estatuto social ou na sua riqueza, mas na sua essência enquanto ser criado à imagem de Deus e destinado a um destino eterno. Esta dignidade é inerente e inalienável, independentemente das circunstâncias externas.

As implicações desta visão para a conceção dos direitos e das liberdades são consideráveis. Ela serviu de base à ideia de que todos os seres humanos merecem respeito e consideração, porque cada um deles possui um valor inestimável. Esta perspetiva tem influenciado vários movimentos sociais e políticos ao longo dos séculos, em especial os que procuram promover a justiça, a igualdade e a proteção dos mais vulneráveis. Historicamente, também influenciou o desenvolvimento da ética cristã e influenciou pensadores como Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, que procuraram integrar estas ideias num quadro teológico e filosófico mais amplo. Mais tarde, na era moderna, esta conceção influenciou os filósofos do Iluminismo e os pais fundadores da democracia liberal, que articularam os princípios dos direitos naturais e da soberania individual.

A segunda proposição fundamental da mensagem de Cristo, segundo a qual todos os homens são filhos de Deus, teve um impacto profundo e duradouro na compreensão da igualdade e da fraternidade humanas no pensamento ocidental. Esta ideia, que sublinha a igualdade fundamental de todos os seres humanos perante Deus, introduziu um princípio de igualdade radicalmente diferente das hierarquias sociais e das distinções de estatuto que prevaleciam em muitas sociedades antigas e medievais. O ensinamento cristão de que cada pessoa é um filho de Deus implica que todos os indivíduos partilham uma dignidade comum e um valor intrínseco. Esta perspetiva foi revolucionária, sobretudo num contexto histórico em que as distinções de classe, raça, género e etnia estavam muitas vezes profundamente enraizadas. Ao proclamar a igualdade de todos perante Deus, o cristianismo desafiou estas divisões e promoveu um sentido de unidade e solidariedade humanas.

Esta ideia da igual partilha do amor de Deus por todos os seus filhos também influenciou o conceito de direitos humanos. Se todas as pessoas são iguais enquanto filhos de Deus, então todas merecem um tratamento justo e o respeito pelos seus direitos fundamentais. Este pensamento tem sido uma importante força motriz dos movimentos de reforma social e de justiça ao longo da história. Figuras históricas como São Francisco de Assis, que pregava o amor e a fraternidade para com todos os seres vivos, ou reformadores como Martinho Lutero, que sublinhava a importância de a fé e a graça serem acessíveis a todos, encarnaram e divulgaram estas ideias. Mais tarde, no contexto do Iluminismo, filósofos como John Locke e Jean-Jacques Rousseau, embora nem sempre se referissem diretamente a estes ensinamentos cristãos, desenvolveram ideias políticas e sociais que ressoavam com o princípio da igualdade fundamental de todos os seres humanos.

A ideia de que cada indivíduo goza de uma esfera de autonomia individual para realizar o seu próprio destino faz parte de uma visão do mundo em que a vocação espiritual e pessoal é primordial. Esta visão, influenciada pelo cristianismo, sublinha que as estruturas sociais, políticas e económicas são meios para servir o homem na sua busca espiritual e não fins em si mesmas. Esta abordagem marca um contraste significativo com as perspectivas anteriores, em que o indivíduo era frequentemente visto como subordinado às necessidades do Estado ou da sociedade. De acordo com esta visão, o Estado e outras instituições sociais têm o dever de respeitar e proteger a autonomia individual. Isto implica o reconhecimento do direito à liberdade de consciência, pensamento e expressão, bem como a valorização da privacidade e da liberdade individual. A ideia de que o Estado deve servir o indivíduo, e não o contrário, tem sido um desenvolvimento importante no pensamento político e social, influenciando profundamente as teorias modernas dos direitos humanos e da governação democrática. Este conceito encontrou particular ressonância durante o Renascimento e o Iluminismo, quando os filósofos começaram a questionar as estruturas de poder tradicionais e a promover a ideia de direitos naturais inerentes a cada pessoa. Pensadores como John Locke, que defendia o direito à vida, à liberdade e à propriedade, e Immanuel Kant, com o seu imperativo categórico que sublinhava o respeito por cada indivíduo como um fim em si mesmo, ajudaram a moldar esta perspetiva.

Na prática, esta filosofia influenciou a redação de documentos fundamentais como a Declaração de Independência Americana e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão durante a Revolução Francesa. Estes documentos defendem a ideia de que os governos são estabelecidos para proteger os direitos individuais e que a sua legitimidade deriva do consentimento dos governados. Assim, a ideia de que cada ser humano tem uma esfera de autonomia individual na qual pode realizar o seu destino foi fundamental para a evolução das sociedades ocidentais para princípios de liberdade pessoal, respeito pelos direitos individuais e governação democrática. Estes conceitos continuam a constituir a base das sociedades liberais e democráticas contemporâneas, sublinhando a importância do indivíduo na ordem social e política.

O impacto da mensagem cristã no desenvolvimento dos direitos humanos no Ocidente está profundamente ligado ao trabalho dos teólogos jurídicos católicos espanhóis do século XVI, nomeadamente no contexto dos debates em torno da conquista espanhola da América. Estes debates centraram-se em questões morais e jurídicas cruciais relativas ao tratamento dos povos indígenas da América pelos conquistadores espanhóis.

Um dos principais actores deste debate foi Bartolomeu de las Casas, padre dominicano e mais tarde bispo, que se tornou famoso pela sua defesa apaixonada dos direitos dos povos indígenas. Chocado com a brutalidade e a exploração de que foram vítimas os ameríndios, Las Casas opôs-se às teorias e práticas que justificavam a sua escravatura. Defendia o reconhecimento da sua humanidade e dos seus direitos fundamentais, argumentando que, enquanto seres humanos, eram filhos de Deus e mereciam o mesmo respeito e dignidade que os europeus. Outra figura importante nestes debates foi Francisco de Vitoria, teólogo e jurista, considerado um dos fundadores do direito internacional moderno. Vitoria questionou a legitimidade da conquista espanhola com base nos princípios do direito natural. Defendia que os povos indígenas possuíam os seus próprios direitos soberanos e que o seu território não podia ser tomado de forma justa. As suas ideias lançaram as bases de uma argumentação a favor da igualdade e dos direitos fundamentais dos povos indígenas.

Estes debates tiveram lugar num contexto mais vasto de questões éticas e jurídicas suscitadas pelo encontro entre a Europa e as Américas. Os teólogos e juristas espanhóis desempenharam um papel crucial no desenvolvimento das primeiras doutrinas de direitos humanos no Ocidente, articulando argumentos baseados em princípios cristãos que reconheciam a dignidade e os direitos dos povos indígenas. Este período foi fundamental na história dos direitos humanos, pois marcou um ponto de viragem em que os princípios éticos e jurídicos começaram a ser aplicados num contexto global, transcendendo fronteiras e culturas. As ideias e os argumentos desenvolvidos por figuras como de las Casas e de Vitoria lançaram as bases do que viria a ser o direito internacional dos direitos humanos, sublinhando a importância universal da dignidade e da igualdade humanas.

Retrato de Bartolomé de las Casas (anónimo, século XVI).

A afirmação da primeira elaboração doutrinária dos direitos humanos no Ocidente, atribuída a Francisco de Vitoria e Bartolomé de las Casas, marca um ponto de viragem crucial no reconhecimento dos direitos humanos. Estas duas figuras desempenharam um papel decisivo na contestação dos fundamentos éticos e jurídicos da conquista espanhola da América no século XVI, nomeadamente no que respeita ao tratamento dos povos indígenas.

Francisco de Vitoria, teólogo e jurista espanhol, é frequentemente considerado o pai do direito internacional moderno. Nascido em 1492, desenvolveu teorias que defendiam os direitos dos povos indígenas da América, questionando a legitimidade do seu domínio pelos conquistadores espanhóis. Defendia que os índios tinham os seus próprios direitos soberanos, tanto na esfera privada como na pública, e que esses direitos deviam ser respeitados. Vitoria defendia que os povos indígenas tinham direito à sua própria governação e à posse das suas terras, ideias que eram revolucionárias na época. Bartolomé de las Casas, padre dominicano nascido em 1474, tornou-se célebre pela sua fervorosa defesa dos povos indígenas. Denunciou as atrocidades cometidas pelos conquistadores espanhóis e defendeu o respeito pela dignidade e pelos direitos dos índios. De las Casas defendia que os índios eram seres humanos de pleno direito, dotados de razão e capazes de fé, pelo que deviam ser tratados de forma justa e equitativa. Ao reconhecerem a igualdade de direitos dos povos indígenas, Vitoria e Las Casas lançaram as bases de uma conceção dos direitos humanos que transcende as fronteiras culturais e nacionais. Os seus ensinamentos implicavam que todos os seres humanos, independentemente da sua origem étnica ou geográfica, possuem direitos inalienáveis que devem ser respeitados.

Este período marca, portanto, o início da concetualização dos direitos humanos no contexto ocidental, com especial ênfase na igualdade e soberania dos povos. Embora as ideias de Vitoria e Las Casas não tenham conduzido imediatamente a grandes mudanças políticas ou sociais, lançaram as bases intelectuais e morais que influenciaram o desenvolvimento subsequente das teorias dos direitos humanos e do direito internacional. Assim, o século XVI em Espanha pode ser visto como um momento-chave na evolução do pensamento sobre os direitos humanos.

« A nossa religião é uma só e pode servir a todas as nações do mundo; acolhe-as a todas no seu seio e não tira a nenhuma delas a sua liberdade nem os seus senhores; está especialmente longe de querer que as pessoas sejam feitas escravas sob o pretexto de que nasceram para isso, como pretende o Senhor Bispo. Que Vossa Majestade se digne, portanto, no início do seu reinado, exprimir o seu desprezo por esta má doutrina e repudiar as suas consequências. »

— Las Casas

Esta citação de Bartolomé de las Casas ilustra perfeitamente o seu empenhamento na defesa dos direitos e da dignidade dos povos indígenas da América face à conquista espanhola. No seu apelo, Las Casas sublinha vários pontos-chave que reflectem não só as suas convicções religiosas, mas também o seu profundo humanismo. Em primeiro lugar, afirma a universalidade da religião cristã, sublinhando que ela se destina a todas as nações e acolhe todos os povos sem distinção. Esta visão da universalidade e da inclusividade do cristianismo é fundamental, pois rejeita a ideia de que certos povos possam ser intrinsecamente inferiores ou destinados a ser dominados. Em segundo lugar, Las Casas sublinha o respeito pela liberdade e autonomia dos povos. Criticou abertamente a ideia de que a conversão ao cristianismo ou a aceitação do domínio espanhol implicasse a perda da liberdade ou da soberania dos povos indígenas. Considera que a religião cristã não é um instrumento de dominação, mas um meio de elevação espiritual e de respeito mútuo. Por último, apela diretamente à autoridade real, neste caso o monarca espanhol, para que tome posição contra as doutrinas que justificam a escravatura e a opressão dos povos indígenas por motivos religiosos ou raciais. Esta ação de Las Casas é um apelo à responsabilidade moral e política dos dirigentes, exortando-os a rejeitar as ideologias que perpetuam a injustiça e a desigualdade. A citação de Las Casas é um testemunho poderoso dos primeiros tempos da colonização nas Américas, quando vozes como a sua se erguiam em defesa dos direitos dos povos indígenas. Os seus argumentos e ativismo desempenharam um papel crucial na génese do pensamento sobre os direitos humanos e no desenvolvimento das primeiras críticas formais à conquista e à colonização.

Demonstrou que os índios eram criaturas de Deus e não podiam ser escravos. Juntou-se às teses de Vittoria:

« Entre os infiéis, que vivem nesses reinos remotos, que nunca ouviram falar de Cristo, que não receberam a fé, há verdadeiros senhores, reis e príncipes. A lei natural e a lei das nações concedem-lhes Soberania, dignidade e preeminência real... O mesmo se aplica ao domínio dos particulares sobre os bens inferiores... »

— Las Casas[4]

Esta citação de Bartolomé de las Casas ilustra o seu argumento contra a escravatura e a opressão dos povos indígenas, afirmando a sua igualdade intrínseca e a sua soberania como criaturas de Deus. Reconhece explicitamente a legitimidade e a autoridade dos líderes e das estruturas políticas existentes nos povos indígenas, mesmo daqueles que não foram expostos ao cristianismo. Na sua argumentação, Las Casas refuta a ideia de que os povos indígenas poderiam ser legitimamente subjugados ou despojados das suas terras e soberania devido ao seu desconhecimento do cristianismo. Salienta que o direito natural e o direito das nações (ius gentium, um conceito-chave do direito internacional no pensamento medieval e renascentista) reconhecem e respeitam a soberania dos povos não cristãos.

Ao afirmar que os povos indígenas tinham reis, príncipes e estruturas de governação legítimas, Las Casas juntou-se às teses de Francisco de Vitoria, outro teólogo e jurista que defendia a noção de direitos universais e de soberania dos povos, independentemente da sua fé ou conhecimento do cristianismo. Vitoria argumentava que os povos não cristãos possuíam direitos naturais, incluindo o direito à propriedade e à autonomia política, que tinham de ser respeitados pelas potências coloniais. Esta abordagem foi revolucionária para a sua época, pois desafiava as justificações habitualmente apresentadas para a colonização e o domínio dos povos indígenas. Las Casas e Vitoria, com as suas ideias progressistas, ajudaram a lançar as bases do direito internacional moderno e do reconhecimento dos direitos humanos universais, independentemente da raça, cultura ou religião. Em conclusão, os esforços de Las Casas e Vitoria para defender os direitos dos povos indígenas marcaram uma etapa importante na história dos direitos humanos, salientando a necessidade de respeitar a dignidade e a soberania de todos os povos.

A defesa dessas teses por figuras como Bartolomé de las Casas e Francisco de Vitoria, no início do século XVI, representou um passo fundamental no desenvolvimento de uma doutrina dos direitos humanos. Os seus argumentos, centrados na ideia de que todos os seres humanos são iguais enquanto criaturas de Deus, marcaram uma viragem decisiva na compreensão e no reconhecimento dos direitos fundamentais. Esta abordagem doutrinária foi revolucionária para a época, uma vez que se opôs às práticas comuns de conquista, escravatura e colonização baseadas em noções de superioridade cultural, racial ou religiosa. Ao insistirem na igualdade fundamental de todos os seres humanos, independentemente da sua fé, origem étnica ou estatuto social, Las Casas e Vitória desafiaram as justificações para a opressão e exploração dos povos indígenas.

Esta perspetiva radicava numa compreensão cristã da humanidade, em que cada pessoa, enquanto criação de Deus, possui uma dignidade intrínseca e direitos inalienáveis. Esta visão ajudou a lançar as bases éticas e filosóficas para os futuros desenvolvimentos no domínio dos direitos humanos. Os seus ensinamentos tiveram uma influência considerável não só no direito internacional, mas também na forma como as sociedades ocidentais começaram a considerar as questões da justiça, da igualdade e da soberania. Embora os efeitos imediatos da sua defesa tenham sido limitados no contexto da sua época, os princípios que enunciaram continuaram a inspirar as gerações futuras e desempenharam um papel fundamental na evolução dos conceitos de direitos humanos e de respeito pela dignidade humana. Assim, o início do século XVI marca um período importante em que teólogos e juristas começaram a articular uma abordagem doutrinária dos direitos humanos, lançando as bases para um reconhecimento mais alargado da igualdade e do valor inerente a todos os seres humanos.

Origens políticas[modifier | modifier le wikicode]

As origens políticas dos direitos fundamentais podem ser traçadas através de uma série de acontecimentos históricos fundamentais que moldaram o pensamento e a prática política mundial, contribuindo cada um deles com uma pedra para o edifício dos direitos humanos.

A Carta Magna, assinada em Inglaterra em 1215, representa um dos primeiros exemplos concretos de uma limitação legal ao poder real. Embora se destinasse principalmente a proteger os direitos da aristocracia contra o poder arbitrário do rei, introduziu princípios fundamentais como o direito a um julgamento justo, influenciando noções futuras de direitos legais e de governação constitucional. No século XVI, a Reforma Protestante, iniciada por figuras como Martinho Lutero e João Calvino, desafiou a autoridade centralizada da Igreja Católica e promoveu ideias de liberdade de consciência e de interpretação individual das Escrituras. Estas ideias ajudaram a moldar os conceitos modernos de direitos individuais e soberania pessoal. O fim das guerras religiosas na Europa e a assinatura dos Tratados de Vestefália em 1648 não só redesenharam o mapa político da Europa, como também introduziram conceitos fundamentais como a soberania do Estado e o princípio da não ingerência, que têm implicações nos direitos individuais e colectivos. O impacto da Revolução Americana de 1776 foi monumental, com a Declaração de Independência dos Estados Unidos a proclamar princípios como a igualdade fundamental e os direitos inalienáveis. Estas ideias foram retomadas e desenvolvidas durante a Revolução Francesa, em especial com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que estabelece explicitamente direitos como a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão. Por último, a Conferência de Viena de 1815, embora muitas vezes vista como um período de restauração conservadora, lançou as bases da diplomacia moderna e do direito internacional, desempenhando um papel fundamental no reconhecimento e proteção dos direitos fundamentais à escala mundial. Estes acontecimentos, que se estendem por vários séculos, contribuíram significativamente para a evolução da noção de direitos fundamentais. Moldaram não só os sistemas jurídicos e políticos, mas também os valores e ideais que estão na base das sociedades modernas, conduzindo ao reconhecimento universal dos direitos humanos e à sua proteção como uma componente essencial da justiça e da governação internacional.

Magna Carta.
O rei João de Inglaterra assina a Magna Carta.

Na Inglaterra do século XIII, ocorreu um acontecimento marcante que moldou profundamente o curso da história jurídica e política: a redação e assinatura da Magna Carta, ou "Magna Carta", em 12 de junho de 1215. Este documento histórico foi o resultado de um intenso conflito entre o Rei João de Inglaterra e um grupo dos seus vassalos, principalmente barões descontentes e rebeldes. A Magna Carta representou um ponto de viragem decisivo na limitação do poder arbitrário dos monarcas e no lançamento das bases do direito constitucional.

O contexto da época era de crescente descontentamento entre os nobres, em grande parte devido aos elevados impostos impostos pelo Rei João e ao seu fracasso nas campanhas militares, nomeadamente em França. Perante a crescente resistência dos barões, o rei viu-se obrigado a negociar, o que resultou na criação da Magna Carta. Este documento foi revolucionário por várias razões. Em primeiro lugar, reconheceu e garantiu uma série de direitos e privilégios aos barões e, por extensão, a outros súbditos do reino. Embora o seu principal objetivo fosse proteger os interesses da aristocracia, a Magna Carta continha princípios que evocam as nossas concepções modernas de liberdades pessoais. Estes princípios incluíam a garantia de um julgamento justo, a proteção contra a detenção arbitrária e a limitação dos poderes fiscais do rei. Para além disso, a Magna Carta estabeleceu a ideia de que até o rei estava sujeito à lei. Tratava-se de uma noção revolucionária numa altura em que os monarcas eram frequentemente considerados detentores de um poder absoluto e divinamente ordenado. A ideia de que a lei se aplicava igualmente ao soberano lançou as bases do Estado de direito e da governação constitucional nas sociedades ocidentais. Embora a Magna Carta tenha sido repetidamente anulada, revista e restabelecida nos anos que se seguiram à sua primeira promulgação, a sua influência perdurou. É frequentemente considerada como um precursor das constituições modernas e influenciou significativamente o desenvolvimento dos sistemas jurídicos e dos direitos humanos, não só em Inglaterra mas em todo o mundo.

Estes artigos da Magna Carta ilustram o âmbito e a visão revolucionários deste documento em termos de direitos e liberdades. O artigo XXXIX, em particular, estabelece princípios de justiça que são fundamentais para os sistemas jurídicos modernos. A ideia de que nenhum homem livre deve ser punido sem o julgamento legal dos seus pares e de acordo com a lei do país foi revolucionária para a sua época. Este artigo lança as bases do que hoje conhecemos como o direito a um julgamento justo, um elemento-chave do Estado de direito e um princípio fundamental dos direitos humanos.

« Nenhum homem livre será detido ou preso, ou despojado dos seus bens, ou declarado fora da lei, ou exilado, ou executado de qualquer forma, e não actuaremos contra ele nem enviaremos ninguém contra ele, sem o julgamento legítimo dos seus pares e de acordo com a lei do país. »

— Article XXXIX.

O artigo XLI centra-se na liberdade económica e na segurança dos comerciantes. Reconhece a importância de um comércio e de viagens seguros e sem entraves para os comerciantes, estabelecendo simultaneamente regras de conduta em tempo de guerra. Este artigo reflecte uma compreensão precoce da importância do comércio e da mobilidade económica, conceitos essenciais na nossa economia globalizada.

« Todos os comerciantes podem sair livremente e em segurança de Inglaterra, vir para Inglaterra, permanecer em Inglaterra e viajar em Inglaterra, tanto por estrada como por navio, para comprar e vender, sem quaisquer portagens irregulares, de acordo com costumes antigos e justos, exceto em tempo de guerra e se esses comerciantes forem de um país em guerra connosco. Se tais mercadores forem encontrados no nosso país no início de uma guerra, serão detidos, sem qualquer dano para as suas pessoas ou bens, até que nós, ou o nosso Grande Juiz, sejamos informados da forma como os nossos mercadores são tratados no país em guerra connosco e, se os nossos estiverem seguros, os outros estarão seguros no nosso país. »

— Article XLI.

Em conjunto, estes artigos testemunham a evolução gradual das noções de justiça, liberdade pessoal e direitos económicos. A Magna Carta, embora concebida principalmente para proteger os direitos da aristocracia inglesa, lançou as bases de princípios jurídicos que, séculos mais tarde, beneficiariam todos os cidadãos. O documento estabeleceu normas para limitar o poder arbitrário e proteger os direitos individuais, influenciando o desenvolvimento subsequente das democracias constitucionais e dos sistemas jurídicos no mundo ocidental. Estes princípios, enunciados há mais de oito séculos, continuam a ressoar nas cartas de direitos e nas constituições de todo o mundo, atestando a sua importância intemporal e o seu impacto duradouro na conceção dos direitos humanos e da governação equitativa.

Os conflitos entre o Rei e o Parlamento em Inglaterra, particularmente acentuados durante certos períodos da história, desempenharam um papel crucial na elaboração de muitos textos e tratados que garantem os direitos fundamentais. Estes confrontos foram muitas vezes a força motriz de importantes alterações constitucionais e jurídicas, contribuindo para moldar os princípios da governação democrática e dos direitos humanos.

Um dos exemplos mais notáveis é o período da Guerra Civil Inglesa, no século XVII, que opôs as forças monárquicas do Rei Carlos I aos Parlamentares. O conflito culminou com a execução de Carlos I em 1649 e a criação da Commonwealth de Inglaterra sob a direção de Oliver Cromwell, marcando um período de republicanismo experimental. Embora a Commonwealth tenha sido de curta duração, terminando com a restauração da monarquia em 1660, este período foi significativo para o desenvolvimento do pensamento político e constitucional. Outro momento importante foi a Revolução Gloriosa de 1688, que viu o rei Jaime II de Inglaterra ser destronado e substituído por Maria II e pelo seu marido Guilherme de Orange. Esta transição relativamente pacífica levou à adoção da Declaração de Direitos em 1689, um documento fundamental que estabelecia limites claros ao poder real e afirmava os direitos do Parlamento. Em particular, estabeleceu o princípio de que o Rei não podia governar sem o consentimento do Parlamento e garantiu direitos como a liberdade de expressão no Parlamento, limitações à tributação e o direito a um julgamento justo.

Estes acontecimentos, bem como outros conflitos semelhantes entre o poder monárquico e o Parlamento, ajudaram a moldar uma tradição política em que o respeito pelos direitos fundamentais e a limitação do poder governamental são fundamentais. Estes acontecimentos lançaram as bases para o desenvolvimento posterior da democracia parlamentar em Inglaterra e influenciaram o pensamento político noutras partes do mundo, inspirando sobretudo os fundadores dos Estados Unidos quando redigiram a Constituição americana e a Declaração de Independência. Estes conflitos entre o Rei e o Parlamento em Inglaterra foram cruciais para a emergência e consolidação dos princípios da governação democrática e do respeito pelos direitos fundamentais, princípios que continuam a influenciar os sistemas políticos e jurídicos em todo o mundo.

Origens filosóficas[modifier | modifier le wikicode]

John Locke, filósofo inglês do século XVII, exerceu uma profunda influência na teoria política moderna, nomeadamente no que respeita aos conceitos de direitos naturais e de governo civil. O seu pensamento, articulado principalmente em duas grandes obras, "Dois Tratados sobre o Governo" (1690) e "Um Ensaio sobre o Entendimento Humano" (1689), lançou as bases da filosofia liberal e teve um impacto considerável no desenvolvimento das ideias democráticas e constitucionais. Locke propôs uma visão do governo baseada na ideia de que a autoridade política legítima deriva do consentimento dos governados. Esta noção de consentimento voluntário é a pedra angular da sua teoria política e marca uma rutura com as concepções anteriores de poder monárquico divinamente ordenado ou da supremacia incontestada do Estado. Para Locke, os indivíduos são naturalmente livres e iguais, e qualquer governo legítimo deve basear-se no acordo e na aceitação daqueles que governa.

Segundo Locke, o estado de natureza, uma condição hipotética pré-governamental, caracteriza-se pela liberdade e pela igualdade, mas também pela insegurança e pelo conflito potencial. Para remediar esta situação, os indivíduos celebram um contrato social, abdicando de alguns dos seus direitos naturais em troca da proteção e da ordem proporcionadas por um governo civil. No entanto, esta transferência de direitos não é absoluta. Se um governo não proteger os direitos naturais fundamentais da vida, da liberdade e da propriedade, e se não respeitar o princípio do consentimento, torna-se ilegítimo e os cidadãos têm o direito de lhe resistir ou de o mudar. As ideias de Locke sobre o governo por consentimento, a soberania popular e os direitos naturais foram extremamente influentes. Inspiraram muitos pensadores e líderes políticos, incluindo os redactores da Declaração de Independência e da Constituição dos EUA. As suas teorias sobre o contrato social e os direitos naturais também influenciaram outros filósofos importantes, como Jean-Jacques Rousseau e Immanuel Kant, e desempenharam um papel fundamental na evolução das democracias liberais modernas.

A teoria política de John Locke, centrada no conceito de contrato social, é um elemento fundamental do pensamento liberal e teve uma influência decisiva na compreensão dos direitos e do governo civil. Segundo Locke, os indivíduos no estado de natureza gozam de direitos naturais, mas este estado é também marcado pela incerteza e pela ausência de garantias formais para a proteção desses direitos. É esta situação que leva o homem a estabelecer uma sociedade política através de um contrato social. No estado de natureza, tal como descrito por Locke, os homens são livres e iguais, e cada um possui direitos naturais inalienáveis, como a vida, a liberdade e a propriedade. No entanto, este estado carece de uma autoridade central que resolva os conflitos e garanta efetivamente esses direitos. Perante esta lacuna, os indivíduos optaram voluntariamente por renunciar a uma parte da sua liberdade e dos seus direitos naturais para criar uma sociedade política. Esta transição do estado de natureza para a sociedade política é conseguida através do contrato social, um acordo mútuo para formar uma comunidade política e estabelecer um governo.

O governo legítimo, de acordo com Locke, é, portanto, o produto do consentimento de indivíduos livres e iguais. A sua principal função é proteger os direitos naturais dos indivíduos, que não estavam suficientemente assegurados no estado de natureza. Se o governo falhar nesta tarefa fundamental ou agir de forma despótica, violando os direitos que é suposto proteger, perde a sua legitimidade. Nesse caso, os cidadãos têm o direito de resistir, modificar ou derrubar esse governo. O conceito de Locke teve um impacto profundo na filosofia política moderna. Influenciou a formação de sistemas democráticos de governo em que a soberania reside no povo e o governo é visto como um servidor dos cidadãos, encarregado de proteger os seus direitos e liberdades. As ideias de Locke sobre o contrato social e os direitos naturais foram particularmente influentes na fundação dos Estados Unidos, onde serviram de base à redação de documentos fundamentais como a Declaração de Independência e a Constituição. A teoria do contrato social e do governo civil de Locke constitui um marco na história das ideias políticas, lançando as bases da governação democrática moderna e do reconhecimento dos direitos humanos fundamentais.

A teoria do contrato social, desenvolvida por John Locke e outros pensadores como Jean-Jacques Rousseau, teve uma influência considerável no aparecimento e na formulação das primeiras Declarações dos Direitos do Homem. Esta teoria, que se baseia na ideia de que as sociedades políticas se fundam num acordo voluntário entre indivíduos livres e iguais, lançou as bases filosóficas e teóricas dos princípios de liberdade e igualdade que estão no cerne dos direitos humanos. Estas ideias, nascidas de uma amálgama de origens religiosas, políticas e filosóficas, encontraram particular ressonância em momentos-chave da história, como a Revolução Americana e a Revolução Francesa. A Declaração de Independência Americana, em 1776, e a Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789, são exemplos emblemáticos da forma como a teoria do contrato social influenciou o pensamento político e jurídico.

Nestes documentos, os conceitos de liberdade e igualdade são afirmados como direitos naturais e inalienáveis. A Declaração de Independência americana, por exemplo, proclama que "todos os homens são criados iguais" e dotados de "certos direitos inalienáveis". Do mesmo modo, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão afirma que todos os homens nascem livres e iguais em direitos. Estas declarações marcaram uma rutura significativa com as anteriores concepções de hierarquia social e de poder político, baseadas no direito divino dos reis ou em estruturas de poder desiguais. A fusão de ideias religiosas, nomeadamente a ênfase do cristianismo na igual dignidade de todos os seres humanos, com teorias políticas e filosóficas do contrato social e dos direitos naturais, ajudou a moldar uma nova visão do mundo. Nesta visão, os direitos individuais e a soberania popular são fundamentais e o governo é concebido como um instrumento ao serviço do povo e não como uma autoridade absoluta. Assim, as origens dos direitos fundamentais reflectem um rico património de ideias e práticas, misturando influências religiosas, políticas e filosóficas para chegar a princípios de liberdade, igualdade e justiça que se tornaram pilares das sociedades democráticas modernas. Estes princípios continuam a inspirar e a orientar os esforços de promoção dos direitos humanos e da democracia em todo o mundo.

Apêndices[modifier | modifier le wikicode]

Referências[modifier | modifier le wikicode]

  1. Profil de Victor Monnier sur le site de l'UNIGE
  2. Publications du professeur Victor Monnier
  3. Hommage au professeur Victor Monnier - Faculté de droit - UNIGE
  4. Cf. B. DE LAS CASAS, Aquí se contienen treinta proposiciones muy jurídicas... in A. M. FABIE, Vida y escritos de Fray B. de Las Casas, Madrid